User Experience Design. Reflexão Crítica.
[Sara Marques]

Introdução

User Experience Design baseia-se na interação com o usuário, pretendendo fornecer a melhor experiência através de um produto acessível, desejável, útil, funcional, credível, e, em última análise, de valor, que responda às necessidades do usuário, através de métodos de Design. Actualmente existem inúmeras transmutações de Design, e com a minha reflexão crítica pretendo aprofundar especificamente o paralelismo entre Design Crítico e Especulativo e a ideologia do Design Tradicional. Design Crítico tem como propósito desafiar e contestar a sistematização e estrutura ética, comercialmente motivada, do Design Tradicional. Design Thinking assenta no reenquadramento de problemas de modo a alcançar soluções inovadoras direcionadas às necessidades do usuário. Mas o mesmo é necessário na prática do Design. O contexto social, politico, económico e tecnológico encontram-se em constante desenvolvimento, contrariamente à superficialidade dos cânones do Design, demonstrando a urgência de uma reflexão semântica. Um dos aspetos que me despertou o interesse inicialmente foram as as perspectivas, aparentemente, drasticamente diferentes, e como as poderia conjugar de modo a valorizar a sua utilidade atual e futura.


Design Thinking

Design Thinking representa uma abordagem imprescindível na indústria criativa, e representativo dos princípios de Design Tradicional. Através de um processo reiterado, centrado no usuário, é possível aprofundar e compreender as suas necessidades, contestar suposições, e divergir para redefinir problemas na tentativa de descobrir novas estratégias e fornecer soluções inovadoras. Em última análise, o seu foco é a resolução de problemas, ou seja as soluções, resultantes de um conjunto de métodos práticos.

Apesar de não ser uma prática exclusiva ao design, este pensamento baseia-se na capacidade e sensibilidade do designer de satisfazer as necessidades dos usuários-alvo desenvolvendo empatia pelo mesmos, assumindo assim uma abordagem inteiramente centrada no ser humano. De modo a alcançar ou aperfeiçoar esta funcionalidade humanizada, os praticantes adotam uma filosofia de questionamento que origina um processo de experimentação multifacetado, especialmente útil no que toca a problemas inadequadamente definidos ou previamente desconhecidos.

O processo em questão divide-se, habitualmente, em 5 fases sem ordem ou hierarquia especificada, podendo haver paralelismo ou simultaneidade entre as mesmas, o que reforça e demonstra a iteratividade de Design Thinking. Os conceitos representantes são Empathise; Define; Ideate; Prototype e Test. Resumidamente:

Empathise (Empatia) é a fase em que o designer interage com os usuários, de modo a abandonar a sua perspetiva individual e suposições, para aprofundar o seu conhecimento relativo às suas necessidades e possíveis problemas emergentes.

Define (Definir) é a etapa onde se analisa e sintetiza o estudo realizado na fase anterior, de modo a identificar o problema que deve ser restruturado.

Na etapa Ideate (Idealizar) inicia-se o processo de inovação, onde se gera novas soluções através de caminhos incomuns e raciocínios inovadores.

De seguida, começa a fase experimental, Prototype (Protótipo), onde o objetivo è identificar e obter as soluções indicadas para os problemas e desafios emergentes, criando diversos modelos representativos do produto final.

No Test (Teste), tal como o nome indica, é a fase onde se deve testar, reformular ou averiguar rigorosamente as ideias geradas anteriormente. Usualmente, é um processo minucioso, onde são revelados novos problemas, sendo necessário recorrer às etapas anteriores até alcançar o produto ideal para o usuário.

Design Crítico e Especulativo

Baseando-me na definição de Dunne & Raby. O Design Crítico utiliza o Design Especulativo para romper com suposições, limitações e ideologias de produto impostas pelo design tradicional, trazendo uma nova forma de pensar e perspectiva quanto ao potencial do futuro.

Contrariamente aos princípios tradicionais, Design Crítico não oferece soluções, mas representa um meio de provocação intelectual, sendo mais uma atitude do que um método. O seu objetivo é desenvolver a habilidade de pensar criticamente sobre Design e a sua influência social e comercial, e, fundamentalmente, como podemos utilizá-lo como um medium, ou “intermediário”, contribuinte para o desenvolvimento do mundo. O Design Especulativo é fortemente conceptual, imaginativo e futurista, pretendendo explorar o potencial criativo que o futuro poderá representar.

Esta nova ramificação apresenta então uma perspetiva essencial na atualidade, podendo acompanhar o sucessivo desenvolvimento tecnológico, económico, político e social, tal como as possibilidades que estes representam e introduzem. Com esta evolução no pensamento de Design, é-lhe atribuída uma nova relevância que ultrapassa a monotonia e limitações, previamente impostas quanto às necessidades dos usuários.

O que o torna revolucionário é o reconhecimento da complexidade do ser humano. O Design Tradicional caracterizou o usuário como um ser linear, previsível e obediente, ignorando possíveis e quase inevitáveis inadvertências oriundas da natureza humana, explorando apenas desenlaces “positivos”. Esta mentalidade resulta na produção de soluções, na forma de produtos, que propagam a mentalidade individualista, consumista e industrial, uma abordagem superficial. O Design Critico questiona essa limitação psicológica, e emocional dos produtos concebidos e comercializados, demonstrando a sua hipocrisia. Ao desafiar essa ideologia e explorar a verdadeira multiplicidade que o usuário representa, o “positivo” e o “negativo”, é possível alcançar o propósito tangível do Design na evolução da sociedade.

Curiosamente, uma das suas abordagens é através do humor. Design Crítico utiliza a sátira de modo a agarrar a atenção do público, instigando uma reflexão intelectual que promove a sua capacidade de questionar a relevância e seriedade do assunto em questão. Esta abordagem poderá ser confundida com paródia, que derrota o seu propósito, sendo necessário entender que o objetivo não é desvalorizar o assunto com “piadas”, mas sim facilitar e iniciar um debate.

Reflexão

Após uma breve análise dos diferentes conceitos de Design, é possível verificar que ambos representam ideologias adversas. Com Design Thinking, observamos um processo metódico, que se baseia na resolução de problemas com uma abordagem industrial, sendo conformista e complementar à situação social, política, económica e tecnológica atual, satisfazendo as necessidades do usuário. O Design Crítico e Especulativo atribui uma nova importância ao usuário, quebrando o conformismo tradicionalmente propagado. O objetivo não é fornecer respostas, mas sim procurar novas perguntas, sendo fortemente conceptual e caracterizado como um conjunto de valores. Esta atitude pretende incentivar o próprio usuário a questionar as suas necessidades. Ambos valorizam a indispensabilidade de uma atitude de permanente questionamento, apenas tendo finalidades diferentes. O pensamento tradicional apresenta uma perspetiva comercial e facilitada, utilizando o questionamento de modo a obter um produto. Enquanto o Design Especulativo utiliza-o pela sua complexidade, como uma discussão, para expandir a criatividade e desafiar os limites num contexto futurista. Dune e Raby desenvolvem uma tabela, no livro Speculative Everything, 2013, representante de duas vertentes do design, que vai de encontro com estas duas definições:

[A]
Affirmative
Problem solving
Design as process
Provides answers
For how the world is
Makes us buy

[B]
>Critical
Problem finding
Design as medium
Asks questions
For how the world could
be Makes us Think

(Excerto de A/B manifesto, Dune & Raby)

O propósito da tabela não é identificar dois tipos de Design, mas sim indicar o que o Design Crítico e Especulativo representa. Ambas as listas estão interligadas, demonstrando um paralelismo baseado na antinomia. A lista [B] representa o Design Especulativo, enquanto a lista [A] representa o que este não é. Apesar de não ser atribuída uma prática de Design específica à primeira metade, é possível relacioná-la, quase instantaneamente, com os princípios do Design Tradicional.

Ao analisar o que as listas representam, apesar de contraditórias, existe uma certa complementaridade. A filosofia do Design Crítico e Especulativo é essencial para o nosso futuro e para o abandono da monotonia, limitação e massificação da mentalidade superficial, para a fomentação da sociedade quanto ao futuro. Mas, ao ser fundamentalmente conceptual, não responde às necessidades atuais. O Design Tradicional torna-se igualmente importante devido à sua capacidade de alcançar soluções imediatas, o que o torna útil e aplicável na atualidade.

Uma das soluções para a adoção de ambas as ideologias seria a incorporação dos princípios do Design Crítico e Especulativo no método de Design Thinking, apresentando produtos ou narrativas que incitassem e incluíssem tanto os designers como os usuários, de modo a decidirem coletivamente o que seria mais adequado, resultando na expansão do espectro de soluções e da mentalidade comercial.

Conclusão

Em suma, apesar das antinomias evidentes entre os conceitos retratados, é necessário consolidar ambas ideologias, e não substituir ou excluir uma. O designer tradicional vê como sua função servir e satisfazer o usuário através da resolução de problemas, ou soluções, concedendo apenas respostas. O seu sucesso é então classificado de acordo com a sua comercialização, através do seu lucro. Um designer que adote a atitude do Design Crítico e Especulativo pretende iniciar um debate que se baseia na exploração conceptual e criativa, através do questionamento que visa encontrar problemas na sociedade atual. O sucesso desta abordagem é ditado pela sua capacidade de provocação do usuário.

Contudo, a força conceptual e futurista não é suficiente por si mesma, sendo necessário acompanha-la com os ideais tradicionais comerciais de modo a contribuir para o desenvolvimento do mundo e sociedade. Ao incorporar a mentalidade especulativa e crítica no método tradicional do design será possível observar um avanço extraordinário, socialmente consciente tal como inovador.

Dunne, A., & Raby, F. (2013). Speculative Everything: Design, Fiction, and Social Dreaming. - A / B Manifesto

Webgrafia

https://interaction-design.org/literature/article/what-is-design-thinking-and-why-is-it-so-popular
https://www.interaction-design.org/literature/topics/challenge-assumptions
http://www.theagileelephant.com/what-is-design-thinking/
http://dunneandraby.co.uk/content/bydandr/13/0